O contrato de vesting tem sido uma realidade cada vez maior no Brasil, em especial no âmbito das startups. Trata-se de um contrato por meio do qual a empresa pactua uma possível distribuição de suas ações ou quotas – de forma gradual e progressiva – ao beneficiário, seja ele um funcionário, um prestador de serviço ou até mesmo um sócio, com base em parâmetros de tempo e/ou metas predefinidos.
O contrato de vesting é, portanto, a outorga de uma opção de compra das quotas/ações da sociedade, por preços previamente estabelecidos e condicionada ao efetivo decurso de tempo ou ao cumprimento de metas, razão pela qual não possui natureza salarial e não representa contrapartida pelo trabalho.
Sua utilização é muito comum em momentos iniciais da empresa, em que o empreendedor não possui capital suficiente para contratar com preços competitivos e depende de uma equipe qualificada. Apesar de o beneficiário não ser tão bem remunerado em um primeiro momento, ele terá a opção de futuramente participar do quadro societário dessa empresa, que pode ter um potencial de crescimento.
É importante chamar a atenção para o fato de que, se não houver uma redação clara no contrato acerca da verdadeira intenção das partes (aquisição de quotas societárias após o preenchimento de certos requisitos de trabalho e de tempo, por exemplo), o contrato de vesting pode abrir margem à interpretação de que, na verdade, buscou-se “camuflar” uma remuneração trabalhista, o que pode ensejar a condenação da empresa ao pagamento de verbas e de adicionais ao empregado (FGTS, férias, 13º salário).
Essa foi exatamente a discussão posta no julgamento do RTOrd 1000856-03.2017.5.02.0023 pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), que analisava a existência, ou não, de vínculo empregatício em contrato de vesting pactuado entre o Reclamante e o sócio de uma startup.
No caso examinado, o Reclamante havia firmado contrato de vesting com uma startup, no qual foram estabelecidos parâmetros de tempo e de metas que, se cumpridas, lhe dariam o direito de integrar o quadro societário da empresa.
O contrato, contudo, foi rompido ainda durante o período probatório (“cliff”) em razão da ausência de qualificação técnica do colaborador. Este, irresignado, ajuizou medida judicial a fim de obter o reconhecimento de vínculo empregatício com a startup, pleiteando o pagamento de todas as verbas trabalhistas supostamente devidas.
Como se sabe, para a configuração de vínculo empregatício, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) exige o preenchimento dos seguintes requisitos: subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade.
No caso levado ao TRT2, os magistrados entenderam não estar presentes todos os requisitos necessários à configuração de relação trabalhista em virtude de 3 (três) fatores primordiais: (i) ausência de salário (onerosidade); (ii) ausência de pessoalidade nas tratativas, já que a entrada e a saída do Reclamante foram negociadas por seus advogados; e (iii) ausência de subordinação, uma vez que o Reclamante adotava postura de verdadeiro sócio em relação aos empregados, mesmo que ainda não integrasse o quadro societário da empresa.
Embora o contrato de vesting seja uma ferramenta estratégica para garantir o crescimento da empresa de forma menos onerosa, a repercussão do julgamento narrado e todas as controvérsias doutrinárias dele resultantes evidenciam a importância de o instrumento contratual ter uma redação absolutamente clara e precisa, a fim de que não haja margem para dúvidas quanto à sua natureza.
Entre outros aspectos, devem ser definidos os critérios de produtividade/tempo, a quantidade de ações referentes a cada critério, o prazo de carência para o exercício da opção de compra, além dos preços e das condições para a aquisição das quotas/ações.
Uma vez estabelecido que o vesting é uma opção de compra de ações ou quotas e não uma espécie de contrapartida salarial – e que, consequentemente, o direito adquirido pelo colaborador é de subscrição futura de participação societária – esse contrato se torna perfeitamente possível para a realidade das empresas.
No próximo artigo, analisaremos as modalidades contratuais que comportam o contrato de vesting, as cláusulas normalmente inseridas nesse tipo de instrumento contratual, bem como os tipos societários em que ele pode ser utilizado.